Terapia de Viagem

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De que adianta viajar?
Eu saí do Brasil há pouco mais de 9 meses. Sai sem data pra voltar, com um monte de lugares pra conhecer e sem um grande propósito em mente. Mas o próprio ato de viajar desvendou para mim um véu de sentimentos, experiências e sensações que até então estavam encobertos e inacessíveis.

Viajar proporciona uma perspectiva mais ampla sobre a vida. Nos permite ver a grande imagem.
Mas o que tudo isso significa? Significa que os nossos sistemas de crenças são testados. Sempre que viajo, eu tenho que abrir mão daquilo que eu penso que sei, quem eu penso que sou, para onde eu penso que estou indo. Eu raramente tenho ideia de onde vou acabar, quem vou conhecer. É sempre uma nova aventura.

Viajar serve para nos tornar pessoas melhores. É um tipo de terapia.
Sem nenhum sentido místico implicado, todos nós estamos de uma forma ou de outra no que poderia denominar-se uma Jornada Interior. Isto é, estamos tentando desenvolver-nos em certos sentidos. Mas muito além dos aspectos psicológicos, viajar nos modifica fisicamente. A neuroplasticidade mostra que nosso cérebro muda conforme as nossas experiências, então tudo aquilo de fantástico que é vivido nos entrega um cérebro novo, novos circuitos neurais, novos caminhos e até conexões onde antes havia nada.

A grosso modo, a lógica de viajar é ir para lugares que possam ajudar-nos em nossa evolução interna. A jornada externa, então, deveria nos ajudar na interna. Viajar nos força a sair da zona de conforto e com isso nos convida a ver e experimentar a vida de um jeito diferente.

Cada local do mundo contém qualidades que podem auxiliar em algum tipo de mudança benéfica no interior de uma pessoa. No Rio Mendoza, em Blanco Encalada, eu observava suas pedras ovaladas e lisas que um dia pertenceram aos picos mais altos da Cordilheira dos Andes, mas que em milhões e milhões de anos, se moveram vagarosamente até chegar aonde estavam. É apenas um lugar, mas observado psicologicamente é também um destino interior, um lugar com perspectiva, livre de preocupações com trivialidades e mesquinhezas. Algures imbuído em calma e resiliência. E foi observando o tempo e os seus resultado de centenas de milhares de anos, que eu me vi no momento presente.

Hoje em dia, frequentemente, nós viajamos sem saber realmente o que há de errado conosco, ou entender precisamente como nosso destino escolhido pode ajudar-nos. Deveríamos tornar-nos viajantes mais conscientes em uma busca bem articulada por qualidades que os lugares possuem, como calma ou perspectiva, sensualidade ou rigor.

Religiões costumavam levar viagens muito mais a sério do que nós levamos agora. Para eles era uma atividade terapêutica. Na idade média quando havia algo errado alguém, esse deveria realizar uma peregrinação para comungar com relíquias de um santo ou um membro da Família Sagrada.

Se você tinha dor de dente, você iria para Roma, na Basília de São Lorenzo e tocaria os ossos do braço de Santa Apolônia, a santa padroeira dos dentes. Se você estivesse em um casamento infeliz, poderia ir para Umbria, para tocar o santuário de Santa Rita de Cássia, a santa padroeira dos problemas matrimoniais. Se você estivesse preocupado com relâmpagos, você seria enviado para Bad Münstereifel na Alemanha, para tocar o crânio de São Donato, que supostamente oferecia ajuda contra incêndios e explosões. Podemos não acreditar mais no poder divino das viagens, mas certas partes do mundo ainda têm o poder de mudar e reparar nossas partes machucadas. Deveríamos seguir os antigos peregrinos e empenhar-nos para evoluir nosso caráter de acordo com as sugestões oferecidas pelos lugares em que estivemos.

Em setembro de 1786, depois de 10 anos como ministro da cidade de Weimar, perto dos seus 40 anos, Johann Wolgang Von Goethe se cansou de sua vida na Alemanha. O filósofo e poeta alemão, então, viajou até Roma com a clássica ideia do significado de viajar, de que a jornada externa servia como suporte a jornada interna com destino a maturidade. Ele dizia que haviam partes dele que só poderiam ser descobertas na Itália. Mas como a maioria das pessoas que vão a Roma, ele se sentiu desapontado. No seu famoso livro de poemas “Viagem à Itália” ele descreve como a cidade era cheia de ruínas famosas, mas que para ele, não significavam muito. “Falem comigo, suas pedras!”, ele exclamava. Goethe entendeu, então, que o que ele precisava não seria encontrado apenas na cidade, mas na pessoa certa para ter uma relação. Em seus poemas ele descreve Faustina, uma mulher a quem conheceu e que transpirava o espírito da cidade. Eles passavam várias tardes na cama enquanto ela lhe contava sobre sua vida e descrevia as construções por onde passava quando ia ao mercado. Assim Goethe encontrou sua paixão pelas obras de Rafael e Andrea Palladio.

Para Goethe, a ideia de viajar não era apenas relaxar ou dar uma pausa na rotina, ele tinha um objetivo maior em mente. Viajar é encontrar o ingrediente que falta na nossa própria maturidade.

Viajar permite explorar novas culturas, permite provar novas comidas, sejam boas ou ruins, permite conhecer novas pessoas com jornadas distintas, ver de onde elas vieram. Cada parte dessas experiências externas nos ajuda no nosso autoconhecimento.

Em um mundo ideal as agências de viagem seriam manejadas por um novo tipo de psicoterapeuta. Eles tomariam conta não apenas dos voos e hotéis, eles começariam encontrando o que há de errado conosco e como poderíamos querer mudar. Pelo diagnóstico poderia ser prescrito aos ansiosos ver as majestosas e imemoriais ondas quebrando nas falésias na costa oeste da Irlanda. Pessoas muito apáticas, poderiam ser enviadas para Nova Iorque. Alguém insatisfeito com sua vida sexual poderia ser recomendada uma viagem ao carnaval de Porto Seguro, em Bahía no Brasil.

Mas do que nós precisamos é reaprender como sermos ambiciosos quanto à viagens, vendo-as como forma de nos ajudar a nos desenvolver em versões melhores de nós mesmos.

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